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Pobreza menstrual atinge milhões de mulheres no Brasil e no mundo

O Brasil busca mitigar o problema com a distribuição gratuita de absorventes, mas mulheres ainda enfrentam dificuldades no acesso ao benefício

A pobreza menstrual ainda é uma realidade enfrentada por milhões de meninas e mulheres em todo o mundo, especialmente em países em desenvolvimento. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 500 milhões de mulheres não possuem acesso a condições adequadas para lidar com a menstruação de forma higiênica e segura. 

Dados da UNICEF revelam que 33% das mulheres brasileiras já usaram papel higiênico no lugar de absorventes. Em situações mais extremas, mulheres utilizam materiais impróprios como jornais ou panos sujos, o que pode causar infecções graves, doenças urogenitais e até mesmo câncer de colo de útero. 

No Brasil, o tema ganhou destaque com a aprovação da Lei n° 14.214, sancionada em 8 de março de 2023, que estabelece a distribuição gratuita de absorventes para meninas e mulheres em situação de vulnerabilidade. A iniciativa tem como objetivo combater os impactos negativos da falta de acesso a itens de higiene menstrual, como o aumento da evasão escolar e riscos à saúde. 

A relatora do projeto de lei no Senado, senadora Zenaide Maia (PSD-RN), destacou a gravidade da situação. “Uma em cada quatro meninas faltam às aulas por não ter acesso a absorventes”, afirmou. O projeto foi originalmente apresentado pela ex-deputada federal Marília Arraes (Solidariedade-PE) em 2021 e sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 

DISTRIBUIÇÃO VIA FARMÁCIA POPULAR

A distribuição de absorventes é realizada por meio das farmácias credenciadas ao programa Farmácia Popular e pelas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), mediante inscrição prévia no Cadastro Único (CadÚnico), que identifica famílias de baixa renda. No entanto, o acesso ao benefício tem encontrado desafios. 

A estudante Mireia Vitória, de 28 anos, relatou dificuldades para acessar o aplicativo de cadastro. “É a quarta vez que coloco meu e-mail e senha, mas não consigo passar dessa fase. Está complicado, porque isto já não é de agora”, disse em entrevista. 

No Brasil, as mulheres que estão entre os 5% mais pobres do país precisariam trabalhar até quatro anos apenas para cobrir o custo dos absorventes que utilizarão ao longo da vida. Por isso, iniciativas que garantam acesso a itens de higiene menstrual são fundamentais para preservar a dignidade e a saúde dessas mulheres. 

Segundo o Ministério da Saúde, as beneficiárias cadastradas podem retirar até 40 absorventes a cada 56 dias, ou seja, a cada dois ciclos menstruais. 

Além de facilitar o acesso ao item básico de higiene, o programa prevê conscientização e treinamento dos profissionais de saúde para atender as necessidades específicas de meninas e mulheres. No entanto, especialistas apontam que o programa precisa considerar as individualidades de cada mulher. 

VARIEDADE DE ABSORVENTES É ESSENCIAL 

A ginecologista Marcelle Thimoty destaca que fluxos menstruais variam entre as mulheres, e os produtos devem ser apropriados para cada caso. “Para uma paciente que menstrua pouco, um absorvente pequeno é suficiente. Para pacientes com fluxo menstrual muito forte, inclusive caracterizado por hemorragias, com saída de coágulos, geralmente, elas têm que usar absorventes grandes, chamados de noturnos, ou até mesmo fraldas para conter esse fluxo menstrual.”, explica a médica. 

A especialista reforça que, além de oferecer absorventes, é fundamental que as políticas públicas considerem as diferentes necessidades das beneficiárias para garantir uma distribuição eficaz e justa. 

DIFICULDADES PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE RUA 

Mulheres em situação de rua enfrentam um desafio adicional: a falta de roupas íntimas adequadas para utilizar absorventes. A psicanalista, psicóloga e educadora menstrual Francielle Alves destaca a importância de considerar essa questão. “Pessoas em situação de rua têm um duplo problema, que é a questão da calcinha. Para você usar um absorvente, você vai precisar de calcinha”, alerta. 

Julia Valladão, assistente social e voluntária do projeto Formas da Rua, compartilha experiências sobre as limitações do benefício. Segundo ela, algumas mulheres já receberam apenas protetores diários ao tentar retirar absorventes. “Um absorvente desse não dá para nada”, afirmou. 

Para mulheres sem cadastro no CadÚnico, a retirada dos absorventes pode ser feita em unidades básicas de saúde e centros de referência, como CRAS e CREAS. A funcionária da Ouvidoria-Geral do SUS, Yasmim Carvalho, explicou que, em caso de mulheres em situação de rua sem cadastro, elas devem ser orientadas a procurar o CRAS para mais informações sobre como acessar o benefício. 

No entanto, segundo Valladão, muitas mulheres em situação de vulnerabilidade não sabem como acessar o benefício ou desistem por conta das dificuldades burocráticas. “Muitas vezes essas moradoras de rua nem tentam acessar o direito. Não por não saberem que existe, mas porque não aguentam mais receber um não”, lamenta. 

O combate à pobreza menstrual no Brasil é um passo importante para garantir que meninas e mulheres possam ter uma vida mais digna, saudável e plena. Apesar dos avanços com a distribuição gratuita de absorventes, ainda há muito a ser feito para garantir o acesso universal ao benefício, principalmente para as mulheres mais vulneráveis. Políticas públicas que contemplem a diversidade de necessidades e que reduzam as barreiras burocráticas são essenciais para alcançar esse objetivo. 

Fonte
Jornal de Brasília
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